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quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Joaquim Maria Machado de Assis (Rio de Janeiro, 21 de junho de 1839 — Rio de Janeiro, 29 de setembro de 1908) foi um romancista, dramaturgo, contista, jornalista, cronista e teatrólogo brasileiro, considerado como o maior nome da literatura brasileira e um dos mais influentes escritores e romancistas da literatura mundial, de forma majoritária entre os estudiosos da área.[1][2] Sua extensa obra constitui-se de nove romances e nove peças teatrais, 200 contos, cinco coletâneas de poemas e sonetos, e mais de 600 crônicas.[2][3] Machado assumiu cargos públicos ao longo de toda sua vida, passando pelo Ministério da Indústria, Viação e Obras Públicas, Ministério do Comércio e pelo Ministério das Obras Públicas. No dia 20 de julho de 1897 com iniciativa de Lúcio de Mendonça, fundou a Academia Brasileira de Letras.[4]
A obra ficcional de Machado de Assis tendia para o Romantismo em sua primeira fase, mas converteu-se em Realismo na segunda, na qual sua vocação literária obteve a oportunidade de realizar a primeira narrativa fantástica e o primeiro romance realista brasileiro em Memórias Póstumas de Brás Cubas (sua magnum opus).[5] Ainda na segunda fase, Machado produziu obras que mais tarde o colocariam como especialista na literatura em primeira pessoa (como em Dom Casmurro, onde o narrador da obra também é seu protagonista). Como jornalista, além de repórter, utilizava os periódicos para a publicação de crônicas, nas quais demonstrava sua visão social, comentando e criticando os costumes da sociedade da época, como também antevendo as mutações tecnológicas que aconteceriam no século XX, tornando-se uma das personalidades que mais popularizou o gênero no país.[6]
Filho do mulato Francisco Manuel José de Assis, pintor de paredes e descendente de escravos alforriados, e de Maria Leopoldina Machado, uma lavadeira açoriana[7] da Ilha de São Miguel. Machado de Assis, que era canhoto,[8] passou a infância na chácara de D. Maria José Barroso Pereira, viúva do senador Bento Barroso Pereira, na Ladeira Nova do Livramento, (como identificou Michel Massa), onde sua família morava como agregada, no Rio de Janeiro. De saúde frágil, epilético, gago,[1][9] sabe-se pouco de sua infância e início da juventude. Ficou órfão de mãe muito cedo e também perdeu a irmã mais nova. Não frequentou a escola regular, mas, em 1851, com a morte do pai, sua madrasta Maria Inês, à época morando no bairro em São Cristóvão, emprega-se como doceira num colégio do bairro, e Machadinho, como era chamado, torna-se vendedor de doces. No colégio tem contato com professores e alunos, e provavelmente tenha assistido às aulas quando não estava trabalhando.
Mesmo sem ter acesso a cursos regulares, empenhou-se em aprender e se tornou um dos maiores intelectuais do país, ainda muito jovem. Em São Cristóvão, conheceu a senhora francesa Madame Gallot, proprietária de uma padaria, cujo forneiro lhe deu as primeiras lições de francês, que Machado acabou por falar fluentemente, tendo traduzido o romance Os Trabalhadores do Mar, de Victor Hugo, na juventude. Também aprendeu inglês, chegando a traduzir poemas deste idioma, como O Corvo, de Edgar Allan Poe. Posteriormente, estudou alemão, sempre como autodidata.
De origem humilde, Machado de Assis iniciou sua carreira trabalhando como aprendiz de tipógrafo na Imprensa Oficial, cujo diretor era o romancista Manuel Antônio de Almeida. Em 1855, aos quinze anos, estreou na literatura, com a publicação do poema "Ela" na revista Marmota Fluminense. Continuou colaborando intensamente nos jornais, como cronista, contista, poeta e crítico literário, tornando-se respeitado como intelectual antes mesmo de se firmar como grande romancista. Machado conquistou a admiração e a amizade do romancista José de Alencar, principal escritor da época. Era, no dizer do historiador literário Marques da Cruz, "ponderado e honesto. Sóbrio na vida e no estilo".[10]
Baptiste Louis Garnier, convida Machado a trabalhar no Jornal das Famílias (1863 - 1878), onde tem contato com as obras de Shakespeare, através das páginas do periódico.[11]
Em 1864 estreia em livro, com Crisálidas (poemas). Em 1869, casa-se com a portuguesa Carolina Augusta Xavier de Novais, irmã do poeta Faustino Xavier de Novais e quatro anos mais velha do que ele. Em 1873, ingressa no Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, como primeiro-oficial. Posteriormente, ascenderia na carreira de servidor público, aposentando-se no cargo de diretor do Ministério da Viação e Obras Públicas.
Podendo dedicar-se com mais comodidade à carreira literária, escreveu uma série de livros de caráter romântico. É a chamada primeira fase de sua carreira, marcada pelas obras: Ressurreição (1872), A Mão e a Luva (1874), Helena (1876), e Iaiá Garcia (1878), além das coletâneas de contos Contos Fluminenses (1870), , Histórias da Meia Noite (1873), das coletâneas de poesias Crisálidas (1864), Falenas (1870), Americanas (1875), e das peças Os Deuses de Casaca (1866), O Protocolo (1863), Queda que as Mulheres têm para os Tolos (1864) e Quase Ministro (1864).
Em 1881, abandona, definitivamente, o romantismo da primeira fase de sua obra e publica Memórias Póstumas de Brás Cubas, que marca o início do realismo no Brasil. O livro, extremamente ousado, é escrito por um defunto e começa com uma dedicatória inusitada: "Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico como saudosa lembrança estas Memórias Póstumas". Tanto Memórias Póstumas de Brás Cubas como as demais obras de sua segunda fase vão muito além dos limites do realismo, apesar de serem normalmente classificados nessa escola. Machado, como todos os autores do gênero, escapa aos limites de todas as escolas, criando uma obra única.
Retrato de Machado de Assis em 1905.
Na segunda fase suas obras tinham caráter realista, tendo como características: a introspecção, o humor e o pessimismo com relação à essência do homem e seu relacionamento com o mundo. Da segunda fase, são obras principais: Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881), Quincas Borba (1892), Dom Casmurro (1900), Esaú e Jacó (1904), Memorial de Aires (1908), além das coletâneas de contos Papéis Avulsos (1882), Várias Histórias (1896), Páginas Recolhidas (1906), Relíquias da Casa Velha (1906), e da coletânea de poesias Ocidentais. Em 1904, morre Carolina Xavier de Novaes, e Machado de Assis escreve um de seus melhores poemas, Carolina, em homenagem à falecida esposa. Muito doente, solitário e triste depois da morte da esposa, Machado de Assis morreu em 29 de setembro de 1908, em sua velha casa no bairro carioca do Cosme Velho. Nem nos últimos dias, aceitou a presença de um padre que lhe tomasse a confissão. Bem conhecido pela quantidade de pessoas que visitaram o escritor carioca em seus últimos dias, como Mário de Alencar, Euclides da Cunha e Astrogildo Pereira (ainda rapaz e por isso desconhecido dos demais escritores), ficcionalmente o tema da morte de Machado de Assis foi revisto por Haroldo Maranhão. Não tinha uma visão religiosa, sendo assim declarando-se como ateu.

Estilos literários

É considerado por muitos o maior escritor brasileiro de todos os tempos e um dos maiores escritores do mundo, enquanto romancista e contista. Suas crônicas não têm o mesmo brilho e seus poemas têm uma diferença curiosa com o restante de sua produção: ao passo que na prosa Machado é contido e elegante, seus poemas são algumas vezes chocantes na crueza dos termos similar talvez à de Augusto dos Anjos.
Em sua fase romântica: ambítua seus poemas em ambiente urbano, espelha-se em José de Alencar, mas sem sua rispidez e sua volúpia, pelo contrário mostra certo conservadorismo.[12]
Abandona muita dessas características e publica Memórias Póstumas de Brás Cubas, iniciando o realismo no Brasil, um tom próximo ao coloquial, mas com certo requinte, impactante e provocante, incluindo na literatura nacional temas antes não expostos como: a natureza feminina; utiliza-se de ironias refinadas para criticar e abusa da narração em primeira pessoa para criar certo humor, com metalinguagem conversando com o leitor e deixando a obra subjetiva, com uma visão parcial do narrador, o maior exemplo é Dom Casmurro.[12]
Machado reúne os pré-requisitos da genialidade. Possui exuberância, concisão e uma visão irônica ímpar do mundo.
Harold Bloom, crítico literário estadunidense, sobre o escritor brasileiro Machado de Assis[13]
O crítico estadunidense Harold Bloom considera Machado de Assis um dos 100 maiores gênios da literatura de todos os tempos (chegando ao ponto de considerá-lo o melhor escritor negro da literatura ocidental), ao lado de clássicos como Dante, Shakespeare e Cervantes. A obra de Machado de Assis vem sendo estudada por críticos de vários países do mundo, entre eles, Giusepe Alpi , Edoardo Bizzarri, Houwens Post (Itália); Lourdes Andreassi, Abel Barros Baptista (Portugal); Albert Bagby Jr. , Helen Caldwell, Paul Dixon, Keith Ellis, Richard Graham, David Jackson, Linda Murphy Kelley, Alfred Mac Adam, Samuel Putnam, Jack E. Tomlins e Susan Sontag, Carmelo Virgillo (Estados Unidos da América); Hennio Morgan Birchal (Brasil), Jean-Michel Massa, Anatole France, Adrien Delpech, Pierre Hourcade, Victor Orban (França), John Gledson, John C. Kinnear, John Hyde Schmitt, Tony Tanner (Inglaterra), Albert Dessau, Dieter Woll (Alemanha); Edith Fowke (Canadá).
O estilo literário de Machado de Assis tem inspirado muitos escritores brasileiros ao longo do tempo e sua obra tem sido adaptada para a televisão, o teatro e o cinema. Em 1975, a Comissão Machado de Assis, instituída pelo Ministério da Educação e Cultura, organizou e publicou as edições críticas de obras de Machado de Assis, em 15 volumes. Suas principais obras foram traduzidas para diversos idiomas e grandes escritores contemporâneos como Salman Rushdie, Cabrera Infante e Carlos Fuentes afirmam ser fãs de sua ficção, como também o fez Woody Allen. A Academia Brasileira de Letras criou o Espaço Machado de Assis, com informações sobre a vida e a obra do escritor.
Machado em suas obras interpela o leitor, ultrapassando a chamada quarta parede, nisso tendo sido influenciado por Manuel Antônio de Almeida, que já havia utilizado a técnica, bem como Miguel de Cervantes, e outros autores, mas nenhum deles com tanta ênfase quanto Machado.

Machado de Assis e o social

Machado de Assis não produziu nenhuma obra regionalista, deu preferência utilizar-se da exposição da moral que suportava a sociedade do Segundo Reinado em transição para a República como meio para expor temáticas universais.[14]

Machado e o determinismo

Paralelo ao realismo de Machado, ocorre o Naturalismo, que tem como sua base o determinismo. Em Portugal não ocorre essa separação por não contar com Machado, pois é um dos poucos autores da época, senão o único, a não ser influenciado por essas ideias. Em uma famosa carta ele critica o Primo Basílio de Eça de Queirós por falta de profundidade, já que todos são frutos do meio, são personagens exagerados e presos às suas caricaturas, já predeterminados pelo ambiente. Há algumas contradições como o personagem Quincas Borba com a sua filosofia Humanitismo, na qual o forte é superior ao fraco.[12]

Obra

Toda a obra de Machado de Assis é de domínio público, por ter expirado o correspondente direito de autor em 1978, completando-se 70 anos do falecimento do autor.

Romances

Diretos, de vocabulário enxuto, com um tom de simplicidade, baseados no cotidiano. Com o tempo Machado ganhou confiança e seus contos tonaram-se mais sóbrios: Memórias Póstumas é o início dessa sobriedade.
Os romances não fogem das duas fases de Machado. Em um primeiro momento é influenciado pelo romantismo, por José de Alencar, mas já demonstra certa análises psicológicas, especialmente a feminina, e traços de humor.
Em sua segunda fase, provavelmente influenciado por Flaubert e Balzac, mantém o humor, mas inclui a maldade, pessimismo e sofrimento; os caracteres psicológicos das personagens são aprofundados e a metalinguagem aparece.[15]

Contos

Assim como nos contos, duas fases. Machado é considerado o introdutor de peso do gênero no Brasil, utilizando ironia e humor. Em sua romântica, temática centrada no amor, com enredos pobres, mas com indicativos de sua ironia e capacidade de construir o caráter do personagem, mesmo centrando-se no enredo e não na análise do personagem.
Em sua segunda fase, centra-se na análise psicológica, o enredo é deixado em segundo plano, passa a utilizar os recursos da narração, seus grandes contos nessa fase tendo mulheres como protagonistas.[15]

Teatro

Foi como Machado de Assis iniciou sua carreira literária, escrevendo a maior parte das obras em sua juventude, não tendo muito peso, apenas uma etapa para as suas obras futuras.[15]

Crítica

Desde o início de sua carreira, gostava de fazer críticas teatrais, tendo destaque em "Notícias da Atual Literatura Brasileira: Instinto de Nacionalidade".[16] Escreve sobre o teatro de Alencar, Gonçalves de Magalhães e Macedo.[15]

Poesia

Em seus três livros iniciais tem forte ligação com o romantismo, escrevendo até poesias indianistas, já na época totalmente ultrapassadas. Mas não tem os mesmo excessos românticos e nem a rigidez parnasiana, teve como base investigações da natureza do homem e reflexões filosóficas.[15]
Era o maior nome vivo da literatura no Brasil, quando um grupo de jovens, capitaneados por Lúcio de Mendonça resolve finalmente pôr em prática a ideia da fundação da Academia Brasileira de Letras, nos moldes da Academia francesa. Machado foi seu primeiro presidente e seu discurso de fundação em 1897 revela sua intenção em participar da academia:
Senhores,
Investindo-me no cargo de presidente, quisestes começar a Academia Brasileira de Letras pela consagração da idade. Se não sou o mais velho dos nossos colegas, estou entre os mais velhos. É simbólico da parte de uma instituição que conta viver, confiar da idade funções que mais de um espírito eminente exerceria melhor. Agora que vos agradeço a escolha, digo-vos que buscarei na medida do possível corresponder à vossa confiança.
Não é preciso definir esta instituição. Iniciada por um moço, aceita e completada por moços, a Academia nasce com a alma nova e naturalmente ambiciosa. O vosso desejo é conservar, no meio da federação política, a unidade literária. Tal obra exige não só a compreensão pública, mas ainda e principalmente a vossa constância. A Academia Francesa, pela qual esta se modelou, sobrevive aos acontecimentos de toda a casta, às escolas literárias e às transformações civis. A vossa há de querer ter as mesmas feições de estabilidade e progresso. Já o batismo das suas cadeiras com os nomes preclaros e saudosos da ficção, da lírica, da crítica e da eloquência nacionais é indício de que a tradição é o seu primeiro voto. Cabe-vos fazer com que ele perdure. Passai aos vossos sucessores o pensamento e a vontade iniciais, para que eles os transmitam também aos seus, e a vossa obra seja contada entre as sólidas e brilhantes páginas da nossa vida brasileira. Está aberta a sessão.
Assinatura de Machado de Assis.gif, 1897[18]

Representações na cultura

Machado de Assis já foi retratado como personagem no cinema, interpretado por Jaime Santos no filme "Vendaval Maravilhoso" (1949) e Ludy Montes Claros no filme "Brasília 18%" (2006). Também teve sua efígie impressa nas notas de NCz$ 1,00 (um cruzado novo; até 1989, com valor de mil cruzados) de 1987. Importantes concursos são realizados em todo mundo levando seu nome, a exemplo de Brasília que tem um significativo concurso com seu nome, realizado pelo SESC/DF.

Machado de Assis e o xadrez

Machado de Assis foi um razoável jogador de xadrez, tendo formulado problemas enxadrísticos para diversos periódicos. Participou do primeiro campeonato disputado no Brasil, ficando em terceiro lugar. Em muitas de suas obras, faz menções ao jogo, como por exemplo, em Iaiá Garcia, Esaú e Jacó e A Cartomante

Machado de Assis e o Espiritismo

Avesso às modas importadas da Europa pela elite brasileira, cético quanto às promessas de redenção civilizatória do racionalismo, Machado de Assis foi um crítico severo do espiritismo kardecista. Um exemplo pode ser encontrado na crônica de 29 de agosto de 1889, da série Bons dias!:
"O espiritismo é uma fábrica de idiotas e alienados, que não pode subsistir. [...] Quando eles me vêm contar uns ditos de Samuel e de Jesus Cristo, sublinhados de filosofia de armarinho, para dar na perfeição sucessiva das almas, segundo estas mesmas relatam a quem as quer ouvir, palavra que me dá vontade de chamar a polícia e um carro [de hospício]. Os espíritas que me lerem hão de rir-se de mim, porque é balda certa de todo maníaco lastimar a ignorância dos outros. Eu, legislador, mandava fechar todas as igrejas dessa religião, pegava dos religionários e fazia-os purgar espiritualmente de todas as suas doutrinas; depois, dava-lhes uma aposentadoria razoável."